domingo, 24 de abril de 2011

Meu primeiro carro



O sonho de todo adolescente é, ao chegar aos dezoito anos, ter um carro. Pois eu consegui! Era pequeno, na verdade. Aliás, chamá-lo de pequeno era incentivar o complexo de superioridade do carro. Pra vocês terem uma idéia, para eu entrar nele, precisava usar uma calçadeira! O rádio só tinha ondas curtas, porque ondas médias não caberiam no carro. Cada vez que eu precisava olhar pelo espelho retrovisor de fora, eu esfregava o nariz no pára-brisa! Sem exagero; em qualquer estacionamento ele pagava meia. Mas tinha suas vantagens. Na estrada, por exemplo, seu tivesse que ultrapassar uma jamanta, era simples: passava por baixo! Bom, pra definir de vez o tamanho do carro: para dirigi-lo não precisava de carta de motorista; um bilhetinho já seria suficiente.
Vocês se lembram que, naquele tempo, as placas tinham duas letras e quatro números. As letras da placa do meu carro eram N N. A turma não teve dúvidas e já começou chamá-lo de Nelson Ned!
Naquela época, eu arrumei uma namorada. Numa noite, eu fui buscá-la em sua casa, para o nosso primeiro encontro. Acontece que a moça era jogadora de basquete; por baixo, um metro e noventa. Só de pernas, pelo menos um metro. Mas eu não me intimidei.
Cheguei e ela ainda não estava pronta. A mãe da moça me convidou para entrar e eu fiquei na sala esperando. Logo em seguida o pai chegou da rua e gritou para o seu filho caçula: "Júnior, eu já falei pra você não deixar seus brinquedos esparramados na frente da casa"! Claro! Ele estava se referindo ao meu carro. Mas eu fingi que não percebi!
Finalmente, a minha garota ficou pronta e apareceu na sala. Eu, sentado na poltrona, olhei pra cima e... lembrei-me do tamanho do carro! Mas, resolvi encarar. Aliás, quando a gente é jovem aceita qualquer desafio! Na hora que a garota olhou o carro eu percebi que ela se tocou que estava entrando numa gelada.
Primeiro nos tentamos ela entrando de costas. Não deu! Depois, colocando uma perna primeiro. A outra não entrava! Aí, entrando primeiro com a cabeça. Enquanto nós estávamos tentando resolver o problema, percebi que em torno do carro começou se juntar uma porção de gente e já tinha até um bancando as apostas: "10 contra 1 que não consegue antes da meia-noite"! Outro grupinho também apostava: "É Valisere". "Não, é De Millus". "Que nada! É Hope". Tudo isso porque a minha jogadora de basquete estava de mini-saia. Pra encurtar a história, depois de muito sacrifício, tirando o banco da frente, minha namorada conseguiu entrar no carro.
Resolvemos ir a um Drive-In. No escurinho, coisa e tal, consegui abraçar a moça e comecei dar uns beijinhos em seu rosto. Achei que ela tinha o rosto meio ossudo, mas só depois percebi que estava beijando o joelho esquerdo dela há um tempão! Só depois de uns trinta minutos que eu consegui achar o caminho para dar um beijo na boca da moça! E no meio daquela confusão toda, a ouviela murmurar: "Pensei que pequeno fosse só o carro"! Não entendi bem o que ela quis dizer com aquilo, mas também, naquele rolo todo, era melhor deixar pra lá! E vira daqui, vira de lá, acabei encostando no interruptor da luz do carro. Logo em seguida apareceu a garçonete: "O senhor que comer alguma coisa"?E eu respondi: "Querer eu quero, mas de que jeito"?
A minha namorada se ofendeu e eu expliquei: "Não é nada disso, é que se a gente comer uma azeitona, o carro não agüenta... explode"!
Na verdade, para resolver o problema eu precisava ter uma grande idéia, mas também não tinha como, pois dentro daquele carro nunca caberia uma grande idéia!
Depois de mais de uma hora, vimos que não entraríamos num acordo, então resolvemos ir embora. Olhei para o meu sapato e ele estava cheio de marcas de batom!
O jeito era levar a moça direto pra casa e fim de papo. No caminho de volta, paramos em um semáforo e eu tive a impressão que estava começando a chover. Minha companheira explicou: "Não, não é chuva! É um cachorro que confundiu seu carro com um poste"!
Aí eu comecei a me sentir humilhado. Mas, como desgraça pouca é bobagem, alguns quarteirões à frente, furou um pneu traseiro. Descemos, depois de vinte minutos de procura, descobri que o carro não tinha macaco. Foi então que a moça me humilhou de verdade "Não tem problema! Eu levanto o gigante e você troca o pneu"!
Deixei minha jogadora de basquete em casa e não sei por que ela nunca mais atendeu aos meus telefonemas! Tá certo que logo depois eu troquei por um Gordini. Aí sim! Carro grande é outra coisa! Mas o Nelson Ned ficou marcado na memória para o resto da vida. Afinal, ele era pequeno, mas foi o meu primeiro carro!

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