Qual menino nunca se apaixonou por uma de suas professoras? Eu acredito que nenhum! No meu caso foram várias paixões em séries diferentes, o que já devia demonstrar meu caráter leviano em matéria de amor. Porém, uma delas ficou marcada até hoje. Eu estava na segunda série ginasial, o que hoje é denominada como sexta série do ensino fundamental, ou sei lá que diabo de nome tem hoje. Eu tinha 12 anos e estava naquela fase de olhar constantemente a palma da mão para ver se estava nascendo pêlos mesmo. O nome dela era Dona Lucila, a minha primeira professora de inglês. Foi paixão fulminante! No primeiro dia de aula, eu olhei para aquela deusa e me encantei. Em todas as aulas, eu ficava completamente embevecido, acompanhando cada movimento e cada palavra do "amor definitivo de minha vida". Sentia um arrepio cada vez que ela pronunciava uma palavra que tivesse "th", como "the", "something" e outras, porque ela colocava, por um breve momento, a ponta da língua entre os dentes, para depois recolhê-la e emitir o som correto do vocábulo. Tornei-me o melhor aluno da classe porque queria me sobressair entre todos os outros. Eu precisava, de alguma forma, ser notado por aquela que eu considerava a mulher mais linda do mundo. Finais de semanas era um verdadeiro suplício. Contava os minutos torcendo para que chegasse logo a segunda-feira e poder rever minha paixão; e olha que em menino dessa idade torcer para acabar o final de semana não é normal! Mas chegaram as férias de julho juntamente com o inverno e meu coração ficou gelado. Um mês inteiro sem vê-la, sem acompanhar seus movimentos pela classe, principalmente o balançar de seus quadris quando ela escrevia no quadro negro. Foram as férias mais tristes e mais extensas de minha vida. Agosto chegou! Primeiro dia de aula e no horário tinha Inglês. Havia terminado a aula de Geografia, o professor saiu e eu com os olhos grudados na porta, com o coração aos pulos, aguardando a chegada da minha amada. Entra um professor. Coloca os livros sobre a mesa e diz que iria substituir por uns tempos a professora Lucila porque ela havia se casado e ainda estava em viagem de Lua de Mel! Senti uma pontada dilacerante no meu coração. Eu me sentia traído, enganado, desprezado... a vida não teria mais sentido. Minha nota de Inglês, naquele mês, foi bem inferior às anteriores. Ir pra escola era um tormento (ou seja, passei a ser um garoto normal). Quando Dona Lucila voltou, eu já estava completamente curado e bastante interessado na Dona Clélia, professora de Matemática que, aliás, não entendia como não havia prestado a devida atenção àquela bela mulher. É verdade que Dona Clélia já era casada, mas melhor assim, porque não correria o risco de mais uma triste desilusão. Nem uma, nem outra, com certeza, nunca soube de minhas paixões platônicas, nem sei se ainda estão entre nós, mas se estiverem e, por acaso, lerem este texto, saibam que as duas têm um lugar especial em meu coração, tanto pelo amor nunca correspondido, quanto por tudo que me ensinaram. Obrigado meus grandes amores.
Todo mundo tem mania, ou manias. A minha é de escrever. Escrever sobre mim, sobre coisas, sobretudo sobre tudo. Parafraseando Descartes: Escrevo, logo existo. Apesar que em certos momentos: Escrevo, logo desisto. Mas não por muito tempo. Se você chegou até aqui, seja bem-vindo(a).
sábado, 30 de abril de 2011
sexta-feira, 29 de abril de 2011
A história depois da historinha
Pouca gente sabe, mas todas as sextas-feiras três antigas amigas se encontram às 5 da tarde numa casa de chá para colocar as fofocas em dia e desabafarem os problemas em comum. Disfarçadas, usando roupas convencionais, perucas e óculos escuros, Branca de Neve, Cinderela e Aurora (A Bela Adormecida), chegam praticamente juntas e sentam-se à mesma mesa de sempre:
Branca de Neve: _ Oi amigas, como passaram a semana?
Cinderela: _ A mesma merda de sempre, nada de novo acontece!
Aurora: _ Pois é, sempre a mesma rotina!
Branca de Neve: (Suspirando) _ Quem dera eu pudesse dar um beijo no meu príncipe e transformá-lo num sapo!
Cinderela: _ É, mas pelo que sei você continua mantendo o seu caso com os sete amantes, digo, os sete anões?
Branca de Neve: (olhando para os lados) _ Fala baixo, quer acabar com a minha reputação?
Aurora: (Sorrindo maliciosa) _ Ora, minha querida, todo mundo sabe que aquele tempo em que você viveu na casa deles não foi só dancinhas e beijinhos de despedida na hora deles irem para a mina!
Branca de Neve: _ Mas ninguém pode garantir nada. Só a bruxa malvada sabia, mas ela caiu no precipício. E você Aurora, quando não quer nada com o seu marido continua dizendo que está com dor de cabeça, ou finge que adormeceu pelo efeito do feitiço da bruxa outra vez! (Dá uma gargalhada, percebe que exagerou e se contém).
Cinderela: (Sorrindo) _ Principalmente depois daqueles passeios à tarde com os criados dela!
Aurora: (indignada) _ Olha quem fala! O seu marido já sabe que você quebrou várias vezes os saltos dos sapatinhos de cristal pulando a janela para se encontrar com aquele jovem e belo caçador?
Cinderela: (Fazendo beicinho) _ Também você quer o quê? O meu príncipe vive ocupado com as coisas do reino. Ficar sozinha tanto tempo é fada!
Branca de Neve: (Resignada) _ É, eu sei! Tentar manter aquele desfecho do final da estória, "e viveram felizes para sempre", não é mole, não!
Cinderela: (Desconsolada) _ É verdade! Eu já tentei falar em divórcio por várias vezes, mas essa imposição complica tudo! E cada vez que começo o assunto meu príncipe lembra que poderei sair sem nada e voltar a ser uma Gata Borralheira. Aí não dá, né? Agüentar aquele quase broxa tanto tempo e sair com uma mão na frente e outra atrás, é ruim, hein!
A três riram. Bebericaram em suas xícaras de chá e ficaram mudas por um tempo. De repente Aurora lembrou-se de algo:
Aurora: _ Você souberam da Rapunzel?
Branca de Neve e Cinderela disseram que não e apuraram os ouvidos:
Aurora: (Baixando a voz) _ O príncipe dela descobriu que ela continuava usando a longa cabeleira para que seus amantes subissem até a torre e mandou que os criados raspassem a cabeça dela.
Cinderela: (Levando a mão na boca, mostrando espanto): _ Nossa! E agora?
Aurora: (Debruçando mais na mesa) _ Mas ela arrumou uma escada de cordas!
As três caíram na gargalhada. Chamaram o garçom, pagaram a conta e, depois dos tradicionais beijinhos, cada uma seguiu para o seu lado.
quarta-feira, 27 de abril de 2011
Inexorável
E eles eram Francisco e Clara. Não eram de Assis, mas de uma pequena cidade do interior. E como todo Francisco vira Chico, eram conhecidos como Chico e Clarinha. Foram amigos de infância, daquele tipo de amigos que na adolescência se transformam, inexoravelmente, em namorados. Ficaram noivos numa ceia de Natal para se casarem quase três anos depois no mês de maio, porque, inexoravelmente, amigos que se transformam em namorados e noivam no Natal casam-se em maio. E tinham a convicção de que seriam felizes para sempre, porque, inexoravelmente, todos os que se casam por amor acreditam nisso. Dois anos depois veio Matheus. Não demorou muito chegaram Célio e Célia, os gêmeos. E como acontece com casais que passam a ter filhos as coisas foram ficando mais difíceis, porque isso também é inexorável. Chico já não tinha tanta convicção no “serem felizes para sempre”, mas Clara, apesar de todo trabalho de casa e do cuidado com as crianças, ainda tinha mais fé. E as noites na cama terminavam quase sempre com um boa noite e durma bem. Ou, me acorde as seis, porque, inexoravelmente, a rotina sempre afasta os casais, mesmo os que foram formados por amigos na infância, namorados na adolescência, que ficaram noivos no Natal e se casaram em maio. Chico começava a chegar cada vez mais tarde do trabalho e Clara, cansada pela luta diária, na maioria das vezes já estava deitada ou dormindo. E começou o afastamento, porque era inexorável. Há algum tempo Chico já pensava em separação, mas como poderia sustentar Clara e o três filhos e ainda sobrar dinheiro para o seu próprio sustento? E ele foi ficando porque chegou à conclusão de que aquela situação era inexorável. Clara só chorava às escondidas, mas se Chico olhasse com um pouco mais de atenção teria percebido que o brilho dos olhos havia desaparecido, ou estava encoberto por um véu de cor escura. E foi numa ceia de Natal que, após abrirem os humildes presentes, Chico perguntou ao filho Matheus, já com sete anos, se ele havia gostado do seu presente de Natal. Matheus disse que sim, mas não sabia bem porque achava que o Natal na casa deles não era igual ao Natal que via nos filmes da televisão. Chico tentou explicar que nos filmes as ceias são fartas, os presentes são caros e, normalmente, são filmes americanos e que lá no Natal tem neve. Matheus pensou um pouco e disse que não era isso, pois apesar da neve o Natal nos filmes tinha mais calor. Chico abaixou os olhos por um tempo e quando os levantou encontrou com os de Clara. Duas lágrimas já desprendiam dos cantos do olhos para rolarem, inexoravelmente, pelas face. Chico tentou sorrir. Clara também. E como por encanto um véu de cor escura desapareceu dos olhos de Clara e seus olhos brilharam como num Natal já distante. Chico sorriu de verdade e se aproximou da sua esposa dizendo. “Clara quer se casar comigo nesta noite de Natal com o compromisso de sermos felizes para sempre”? Os olhos de Clara brilharam mais do que todas as lâmpadas de todas as árvores de Natal de toda cidade, e respondeu: “Sim, meu querido. É o que mais quero”! E Chico e Clara foram felizes, porque amigos de infância que se transformam em namorados na adolescência, ficam noivos na noite de Natal e se casam em maio podem se desencontrar por um tempo, mas se tiverem coragem de retornar ao ponto de partida, refazem a caminhada reparando os erros. E isso só poderia ter acontecido numa noite de Natal, inexoravelmente.
terça-feira, 26 de abril de 2011
Façam as malas
E então eu resolvi mudar de ramo. Montei uma agência para levar turistas aos lugares mais inusitados do mundo. O nome da empresa é “Sacan-agens Tur”, uma mistura de “sacana” com “viagens”. E o nome fica facilmente compreensível se eu falar do primeiro roteiro de viagem que minha empresa preparou.
Sairemos de Ribeirão Preto, em avião fretado, indo direto à Bunda. Calma, espere que eu explico. Bunda fica na Austrália, em Hed of Bight, a 78 quilômetros a oeste de Yalata. Bunda proporciona um vista espetacular com penhascos que se estendem por mais de 200 quilômetros com alturas de até 70 metros . Bunda faz a alegria de qualquer fotógrafo.
Depois de curtirmos bem à Bunda vamos direto para Shota. Para quem não conhece, a montanha Shota Rustavelli é uma das maiores da região de Bezengi, na Geórgia, Rússia. Tem 4960 metros de altura e o seu cume (eu disse cume) é permanente coberto por gelo e neve. Se alguém quiser conquistar a Shota vai precisar de muito esforço.
E já que estaremos na Rússia, para dar uma boa relaxada sugerimos Chupa. O assentamento de Chupa fica na costa Oeste do Mar Branco, na região da Carélia, na Rússia. Faz parte da região de Barents, no Círculo Ártico. É um lugar de baixa densidade populacional, repleto de lagos, minas e florestas. Mas apesar de ser uma região belíssima, vai ser preciso muita disposição para enfrentar aquele frio do Carélio.
Depois de todo frio nada melhor do que uma bela praia. Então vamos para Bosta. Esta linda praia fica na Escócia, na ilha Grande Bernera. Tem um visual incrível, porém é bom deixar claro que mesmo no alto verão a temperatura da água de lá não ultrapassa os 13 graus. Porém, temos certeza de que quando estivermos lá muitos dirão: “Que bela Bosta”!
E aproveitando estarmos na Escócia vamos comprar algumas garrafas de scoth e iremos bebendo até Cagar. O nome completo é Cagar Feosaig, um morro de 377 metros que fica no distrito de Sutherland, nas Highland escocesas.
Depois tomaremos nosso avião e voltaremos para o nosso continente. Como a viagem será um pouco longa nada como Boquete para relaxar. Boquete é um distrito da província de Chiriquí, Panamá. Sua capital é a cidade de Bajo (Baixo) Boquete. Apesar da redundância é exatamente esse o nome. A força da economia de Boquete está na cultura de flores e no café. A qualidade do café de Boquete é famosa no mundo inteiro. Além disso, o turismo tem se tornado uma indústria em franco desenvolvimento.
Em nossa última etapa vamos ver Pica de perto. Pica fica no Chile. Trata-se de uma vila incrustada num paradisíaco oásis, em pleno Atacama (o deserto mais árido do mundo). Está a 1.350 metros de altitude e em seus arredores existem plantações de diversos frutos como laranjas, limões e mangas. Muitos deles são utilizados na produção de doces caseiros que são vendidos para todo o mundo. Existem várias termas com temperaturas de até 32,8 graus. É por isso que muitos turistas são apaixonados por Pica.
Na manhã seguinte tomaremos nosso avião e regressaremos à Ribeirão Preto.
Se alguém estiver interessado é só entrar em contato conosco através do e-mail: viagemdokct@minnet.cuum.
Futebol é uma caixinha de surpresas
Essa história é baseada em fatos reais (como se existissem fatos irreais).
Desde a mais tenra idade, Cacau foi um apaixonado por futebol. Começou a jogar no time da escola, quando freqüentava o primeiro grau na sua cidadezinha lá no interior de Minas. Em pouco tempo foi se destacando e passou a ser considerado como o craque do time, em seguida o craque da cidade para já começar a despontar como um futuro Zico e, quem sabe, um futuro Pelé. Na adolescência, foi para o juvenil do único clube da cidade e em pouco tempo já disputava as partidas oficiais no time principal.
Seu Carmelo, dono da padaria, tinha um amigo que era olheiro de uma equipe que disputava a primeira divisão do campeonato mineiro e insistiu para que ele fosse ver Cacau jogar. Só para agradar ao amigo, o olheiro foi e se encantou com o aquele craque que surgia com um enorme potencial. Não demorou e Cacau foi levado para um time grande.
Começou nas equipes inferiores sempre encantando a todos em seus treinamentos. O técnico do time principal, frente a sérios problemas com contusões de vários jogadores, achou que poderia arriscar a lançar Cacau já na equipe. A rádio local destacou a decisão e toda cidade só discutia o assunto.
No domingo, dia do jogo, o estádio lotou. Fazia muito tempo que isso não acontecia. Porém o garoto promessa não começou jogando, sua equipe precisava só de um empate para se sagrar campeã depois de décadas de espera e assim sendo entrou em campo campeã, já que todo jogo começa empatado em zero a zero.
Durante todo o primeiro tempo, um equilíbrio total entre as duas equipes, mas sem abertura de placar. Cacau havia ficado sentado no banco de reservas sentindo que seu coração poderia sair pela boca a qualquer momento. Foi para o vestiário, ouviu as instruções do técnico e a promessa de que poderia ser colocado no jogo a qualquer momento.
Aos 32 minutos do segundo tempo, o time adversário abriu o placar. O técnico pediu para Cacau aquecer. Aos 39 minutos os alto-falantes anunciaram a entrada da grande promessa. A torcida explodiu gritando seu nome. Preste a fazer 18 anos, Cacau entrou confiante.
Os adversários, já sabendo da fama do garoto, fizeram uma marcação especial e por duas vezes foi impedido de mostrar suas qualidades. A tensão da torcida era quase incontrolável. Será que mais uma vez iriam morrer na praia?
Já nos descontos, Cacau recebeu a bola na meia esquerda, driblou o primeiro marcador, deu um chapéu no segundo e ficou cara a cara com o goleiro que saia para fechar o ângulo. Quando o defensor se jogou, Cacau alongou um pouco mais a bola para a direita ficando com o gol livre, na hora de chutar tropeçou num buraco perdendo o equilíbrio e mandou a bola quase no pau da bandeirinha. Logo em seguida o árbitro encerrou a partida.
Como eu disse, a história é real, pois quem me contou foi o próprio Cacau, hoje com 24 anos e que desde os 19 é porteiro lá no meu prédio.
segunda-feira, 25 de abril de 2011
O motoboy
Eu tinha acabado de fechar o jornal, sentado à mesa de um café, quando um rapaz de blusão de couro, brincos nas orelhas (o plural de brinco estou usando para cada uma das orelhas) e um capacete de motoqueiro debaixo do braço parou à minha frente e perguntou:
_ Tio, o dono do baguiu ae disse que o senhor escreve nu jornal, firmeza?
Eu achei estranho e ia dizer que escrevo sim, mas não nu e sim vestido, porém apenas concordei e ele continuou:
_ Seguinte, eu sô motobói, certo mano? E quero defendê nossa crasse. A gente tamo cansado de todo mundo vivê esculachando a gente! A gente somos trabalhador, véi! Eu to aí na correria pra defendê o pão nosso de amanhã, certo?
Eu disse que o certo seria o pão nosso de cada dia, e ele:
_ Não, mano, é o pão de amanhã memo! O de hoje eu já nem comi, porque num deu tempo. A gente samos ijustiçado, mano! Tipo assim, o mesmo playboy que vive esculachando a gente por costurar no trânsuto, recrama se um mano chega com a pitiça fria!
Eu ia comentar alguma coisa, mas ele continuou:
_ Essa truta aí de dizê que a gente vive quebrano retrovisor, pô, mano, os cara tão sempre quemando faxa e a gente temo que passá! A faxa é nossa, véi! Si num quemá faxa, nem buziná nóis buzina!
Eu quis argumentar que ele estava com uma visão errada de lei de trânsito, mas desisti quando ele, continuando, disse:
_ Amarelo no farol é nosso, mano! E qué sabê, véi, muita vez a gente presta serviço de tulidade púbrica!
Eu me interessei por isso e pedi um exemplo.
_ Outro dia, o tiozinho da farmácia falô que eu tinha que levá um remédio orgente pra uma véinha que tava na pior, mano. 10 minuto e 5 retrovisor depois eu já tavo lá! Toquei a campainha uma pá de vez, como não veio ninguém e a porta tava aberta, entrei. A vózinha tava deitada num sofá e mal, véi! Num tinha ninguém cum ela. E fiz a véinha tomá o remédio e fiquei esperano. E nada dela melhorá. Aí me deu uma luiz: vô levá ela no postinho! O que fiz? Pus a vózinha na garupa da moto, amarrei ela no meu corpo e vuei. Em 5 minuto e 9 retrovisor depois a gente chegamo. Tudo bem que ela tava morta, mas chegamo!
Eu estava de boca aberta olhando pra ele sem saber o que dizer e nem precisei...
_ Mas tem um baguiu ae que num entendi: por que será que a vózinha morreu do coração se o remédio que eu tinha levado pra ela era pra asma?
Antes de colocar o capacete, o motoboy ainda disse:
_ Dá uma força pra nóis lá no seu jornal, mano. A gente tamo cansado de ser ijustiçado, firmeza?
Subiu na moto e arrancou, fazendo uma senhora que virava a esquina ter que brecar seu carro bruscamente.
domingo, 24 de abril de 2011
Meu primeiro carro
O sonho de todo adolescente é, ao chegar aos dezoito anos, ter um carro. Pois eu consegui! Era pequeno, na verdade. Aliás, chamá-lo de pequeno era incentivar o complexo de superioridade do carro. Pra vocês terem uma idéia, para eu entrar nele, precisava usar uma calçadeira! O rádio só tinha ondas curtas, porque ondas médias não caberiam no carro. Cada vez que eu precisava olhar pelo espelho retrovisor de fora, eu esfregava o nariz no pára-brisa! Sem exagero; em qualquer estacionamento ele pagava meia. Mas tinha suas vantagens. Na estrada, por exemplo, seu tivesse que ultrapassar uma jamanta, era simples: passava por baixo! Bom, pra definir de vez o tamanho do carro: para dirigi-lo não precisava de carta de motorista; um bilhetinho já seria suficiente.
Vocês se lembram que, naquele tempo, as placas tinham duas letras e quatro números. As letras da placa do meu carro eram N N. A turma não teve dúvidas e já começou chamá-lo de Nelson Ned!
Naquela época, eu arrumei uma namorada. Numa noite, eu fui buscá-la em sua casa, para o nosso primeiro encontro. Acontece que a moça era jogadora de basquete; por baixo, um metro e noventa. Só de pernas, pelo menos um metro. Mas eu não me intimidei.
Cheguei e ela ainda não estava pronta. A mãe da moça me convidou para entrar e eu fiquei na sala esperando. Logo em seguida o pai chegou da rua e gritou para o seu filho caçula: "Júnior, eu já falei pra você não deixar seus brinquedos esparramados na frente da casa"! Claro! Ele estava se referindo ao meu carro. Mas eu fingi que não percebi!
Finalmente, a minha garota ficou pronta e apareceu na sala. Eu, sentado na poltrona, olhei pra cima e... lembrei-me do tamanho do carro! Mas, resolvi encarar. Aliás, quando a gente é jovem aceita qualquer desafio! Na hora que a garota olhou o carro eu percebi que ela se tocou que estava entrando numa gelada.
Primeiro nos tentamos ela entrando de costas. Não deu! Depois, colocando uma perna primeiro. A outra não entrava! Aí, entrando primeiro com a cabeça. Enquanto nós estávamos tentando resolver o problema, percebi que em torno do carro começou se juntar uma porção de gente e já tinha até um bancando as apostas: "10 contra 1 que não consegue antes da meia-noite"! Outro grupinho também apostava: "É Valisere". "Não, é De Millus". "Que nada! É Hope". Tudo isso porque a minha jogadora de basquete estava de mini-saia. Pra encurtar a história, depois de muito sacrifício, tirando o banco da frente, minha namorada conseguiu entrar no carro.
Resolvemos ir a um Drive-In. No escurinho, coisa e tal, consegui abraçar a moça e comecei dar uns beijinhos em seu rosto. Achei que ela tinha o rosto meio ossudo, mas só depois percebi que estava beijando o joelho esquerdo dela há um tempão! Só depois de uns trinta minutos que eu consegui achar o caminho para dar um beijo na boca da moça! E no meio daquela confusão toda, a ouviela murmurar: "Pensei que pequeno fosse só o carro"! Não entendi bem o que ela quis dizer com aquilo, mas também, naquele rolo todo, era melhor deixar pra lá! E vira daqui, vira de lá, acabei encostando no interruptor da luz do carro. Logo em seguida apareceu a garçonete: "O senhor que comer alguma coisa"?E eu respondi: "Querer eu quero, mas de que jeito"?
A minha namorada se ofendeu e eu expliquei: "Não é nada disso, é que se a gente comer uma azeitona, o carro não agüenta... explode"!
Na verdade, para resolver o problema eu precisava ter uma grande idéia, mas também não tinha como, pois dentro daquele carro nunca caberia uma grande idéia!
Depois de mais de uma hora, vimos que não entraríamos num acordo, então resolvemos ir embora. Olhei para o meu sapato e ele estava cheio de marcas de batom!
O jeito era levar a moça direto pra casa e fim de papo. No caminho de volta, paramos em um semáforo e eu tive a impressão que estava começando a chover. Minha companheira explicou: "Não, não é chuva! É um cachorro que confundiu seu carro com um poste"!
Aí eu comecei a me sentir humilhado. Mas, como desgraça pouca é bobagem, alguns quarteirões à frente, furou um pneu traseiro. Descemos, depois de vinte minutos de procura, descobri que o carro não tinha macaco. Foi então que a moça me humilhou de verdade "Não tem problema! Eu levanto o gigante e você troca o pneu"!
Deixei minha jogadora de basquete em casa e não sei por que ela nunca mais atendeu aos meus telefonemas! Tá certo que logo depois eu troquei por um Gordini. Aí sim! Carro grande é outra coisa! Mas o Nelson Ned ficou marcado na memória para o resto da vida. Afinal, ele era pequeno, mas foi o meu primeiro carro!
quarta-feira, 20 de abril de 2011
A Cigarra e a Formiga remix
O mundo está tão mudado que até as velhas fábulas estão sendo alteradas. Vou contar pra você uma nova versão da fábula da Cigarra e da Formiga de La Fontaine.
Durante muitas gerações, a moral dessa história serviu como exemplo para enaltecer o trabalho e a poupança para amenizar os tempos mais difíceis. A formiga que tanto trabalhou estava preparada para enfrentar o inverno, porém a cigarra, que só cantou, sucumbiu aos rigores do frio.
Com a visão do nosso Brasil de hoje esta fábula ficaria assim:
Estava dona Saúva estava envolvida com o seu trabalho, cortando folhas e carregando-as, aos pedaços, para o seu formigueiro, enquanto dona Cigarra só cantava. Bem você já sabe essa parte.
Numa noite muito fria, dona Saúva estava em seu formigueiro quentinha e alimentada, quando ouviu algumas batidas leves em sua porta. Como ela já tinha lido a fábula de La Fontaine, sabia que era a cigarra morrendo de frio e pedindo um pouco de comida. Abriu a porta e viu dona Cigarra tremendo. Quando ia dizer alguma coisa, a cigarra interrompeu:
_ Eu sei, eu sei o que a senhora vai dizer. Eu também já li a fábula, mas estava no roteiro que eu tinha que vir até aqui, então em vim. Tchau!
Quando chegou a primavera. Dona Saúva saiu de sua casa para começar um novo ciclo de trabalho e ficou muda de surpresa. Lá estava dona Cigarra sentada em seu galho todo florido, tocando um violão novo e brilhante, que disse:
_ Não fique com essa cara de boba, dona Saúva, eu explico. Depois daquela noite que estive em sua casa, juntei o resto de forças que tinha e voei até uma cidade. Lá conheci um produtor de discos, gravei uns funks e outras porcarias e ganhei muito dinheiro. Desta forma, como a senhora pode ver, não pereci durante o inverno e tenho o suficiente para todos os outros invernos da minha vida.
Dona Saúva ficou revoltada e enquanto se dirigia para seu local de trabalho achou que o mundo era injusto. Tempos depois a cigarra percebeu que a formiga tinha desaparecido.
Terminou a primavera, chegou o verão e nada de dona Saúva.
Quando o verão já estava dando lugar ao outono, dona Cigarra viu chegar a formiga, toda bronzeada, com roupas transadas e, surpresa, perguntou:
_ Puxa dona Saúva, estou vendo que a senhora também se deu muito bem com o seu trabalho. Parabéns!
Dona Saúva deu um sorriso e disse:
_ Que com o meu trabalho o quê! Depois que vi o tinha acontecido com a senhora eu também resolvi ir para a cidade grande e também fiz sucesso na televisão.
Dona Cigarra ficou mais admirada ainda e comentou:
_ Mas a senhora não sabe cantar!
E dona Saúva explicou:
_ Realmente não sei cantar, mas com uma bunda igual a minha nem precisei. Sou dançarina num grupo de axé, ora!
Moral da história: num país igual ao nosso, pra que moral?
Um país chamado "Enrolândia"
Certa Repartição Pública Federal de um país distante chamado "Enrolândia" tinha três funcionários: o "Diz que faz", o "Faz que Faz e o "Pensa que Faz". Os três eram comandados pelo chefe "Finge que Manda". Acontece que foi realizado um concurso público e, talvez por alguma falha até hoje não perdoada, as pessoas de maior Q.I. (Quem Indicou) não ficaram sabendo e por esse motivo aconteceu a aprovação de uma pessoa realmente competente; o "Faz".
Assim que o "Faz" assumiu, quis saber de seu chefe, o "Finge que Manda", quais seriam suas atribuições. O chefe disse para ele relaxar que os colegas iriam mostrar todo o serviço.
Na primeira semana "Faz" não fez nada e não viu ninguém fazer nada. Apenas o "Pensa que Faz" separava algumas fichas, sabe-se lá para quê! Como a segunda semana parecia que iria transcorrer da mesma forma, "Faz" resolveu tomar algumas providências. Foi até uma prateleira e começou a ler as pastas que ali estavam. Viu que eram processos que estavam parados há algum tempo. Por sua própria iniciativa, decidiu organizar por data todas as pastas dos processos. "Diz que faz" e "Faz que Faz" já se sentiram incomodados com aquilo.
Depois de organizar tudo, "Faz" começou dar andamento aos processos, começando pelos mais antigos. Levou alguns para o chefe "Finge que Manda" despachar. O chefe pediu que ele deixasse as pastas sobre sua mesa, pois assim que terminasse a sua partida de paciência no computador iria dar uma olhada.
Mais uma semana se passou e "Faz" percebeu que as pastas estavam no mesmo lugar. Pediu licença e perguntou para o "Finge que Manda" se ele já tinha despachado os processos. O chefe, irritado, disse:
_ Não falei que iria ver isso assim que terminasse minha partida de paciência? Pois ainda não terminei!
"Faz" pediu desculpas e foi acompanhar o serviço do "Pensa que Faz". Em pouco tempo percebeu que o que o colega estava fazendo não tinha a menor relevância e explicou que ele estava perdendo tempo com tudo aquilo. "Pensa que Faz", que ainda tinha um pouco de boa vontade, pediu para o novo colega indicar que tipo de trabalho ele deveria fazer para ser mais útil. "Faz" deu uma pilha de pasta, pediu que ele catalogasse e que depois conferisse se os documentos exigidos em cada processo estavam todos lá, para em seguida poderem dar prosseguimento.
"Diz que Faz" e "Faz que Faz" sentiram que estava na hora de começarem a se mexer, pois se "Faz" conseguisse um aliado ali dentro, iria começar achar que estava "por cima da carne seca". Marcaram uma reunião com o chefe "Finge que Manda" e mostraram que a presença do novo funcionário poderia ser uma complicação para a rotina com a qual estavam tão acostumados.
"Finge que Manda" avaliou a situação e deu um telefonema para seu superior o "Me Engana que eu Gosto". Este mexeu uns pauzinhos e "Faz" foi despedido à bem do serviço público.
Para o seu lugar foi indicado o sobrinho de uma das amantes do "Sei lá Quem" e tudo voltou ao normal: Os processos voltaram para as prateleiras; "Pensa que Faz" para suas fichas, "Diz que Faz" seguiu falando de como estava cansado por trabalhar tanto, "Faz que Faz" continuou fazendo que fazia e o Chefe "Finge que Manda" continuou tentando terminar sua extenuante partida de paciência.
E o contribuinte que também continue no seu eterno jogo de paciência esperando... esperando...
Máquina de fazer doido
Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta) já dizia na década de 60, que a televisão é uma máquina de fazer doido. Talvez o jornalista tenha exagerado na época, mas uma coisa é certa: a televisão sempre valorizou e, cada vez mais, tem valorizado a imbecilidade: "estado durante o qual os indivíduos, pela fraqueza dos órgãos destinados à manifestação do pensamento, são de uma mediocridade tal que se tornam incapazes de elevar-se ao conhecimento e à razão comuns a todos os indivíduos da mesma idade".
Mas antes de criticarmos tão severamente aos produtores de TV, eu não posso deixar de citar uma crônica do Carlos Heitor Cony. Ele viajava com um amigo e, ao parar num posto de beira de estrada para um café, viu aquelas plaquetinhas de madeira pirografadas com frases como: Saudade de... Lembrança de ... Estive em... e me lembrei de você; e então perguntou: "Quem será que tem mau gosto suficiente para fazer esse tipo de coisa? O amigo respondeu: "Você deveria perguntar diferente: quem será que tem mau gosto suficiente para comprar esse tipo de coisa; pois se alguém faz é porque tem alguém que compra"! Isso pode até servir para dizer que, na verdade, a TV está "pirografando" coisas para aqueles que "compram", não é?
Quer outro dado que pode amenizar a barra da moçada da telinha? Uma informação oriunda da própria Xerox garante que 23% das avarias em suas máquinas, em nível mundial, são causadas por pessoas que se sentam nos aparelhos para fotocopiar seus próprios traseiros! Ora, se uma pessoa estraga uma máquina tão cara para ver o próprio traseiro, imagine do que é capaz para ver traseiros alheios na TV?
Outra pesquisa garante que pelo menos 45% das pessoas do mundo já tentaram lamber ou morder seus próprios cotovelos, o que todo mundo sabe que é impossível.
O que estou querendo dizer é que uma pessoa capaz de tentar morder o próprio cotovelo, ou de fotocopiar sua própria bunda, é perfeitamente capaz de fazer uma assinatura de TV para ficar vendo o Big Brother por 24 horas!
Os objetivos primeiros do Rádio e da Televisão foram de possibilitar que a cultura e a informação, enfim, o conhecimento, pudesse atingir aos pontos mais inacessíveis do planeta. Mas, a partir do momento que esses veículos tornaram-se comerciais e surgiram os institutos de pesquisas para informar aos anunciantes, ou agências de publicidade, como direcionar suas verbas para atingir ao maior público possível, concluiu-se que a programação dos referidos veículos deveria ser também direcionada para pessoas que fotocopiam sua própria bunda e/ou tentam lamber ou morder seus próprios cotovelos!
E não adianta reclamar; se você nunca fez nem uma coisa, nem outra, só tem uma solução: desligue a TV. Como? Você não consegue viver sem assistir TV? Então trate de comprar uma máquina Xerox e de começar treinar contorcionismo, ora!
O Chaplin
Hoje eu quero falar sobre o Chaplin. Não sobre o genial Charlie Chaplin, mas sobre o meu cachorro. Ele recebeu esse nome porque é um vira-lata tal e qual a inesquecível personagem conhecida, no Brasil, como Carlitos. Ele chegou em nossa casa cheio de sarna, aliás coisa que distribuiu com muita generosidade para mim e minha mulher. Talvez, por termos nos coçado em trio por algum tempo, ficamos muito ligados àquele cãozinho. Minha mulher, a pessoa mais otimista que eu conheço, resolveu adestrá-lo. Incansavelmente, por dezenas de vezes ao dia, pedia para que ele desse a patinha ao ouvir a frase "como vai"! Fazia com que o safado cobrisse os olhos com as patinhas dizendo "fique triste", na esperança de que ele repetiria automaticamente o ato dentro de algum tempo. Jogava a bola, ou um bichinho de pelúcia para que ele pegasse e trouxesse de volta. Ele corria para pegar, mas trazer de volta, nunca! Na hora de dar comida fazia com ele ficasse sobre as patas traseiras dizendo "pede"! Em pouco tempo eu conclui que o trabalho de minha mulher não daria resultado, pelo simples fato de Chaplin ser o cachorro mais estúpido do mundo. Depois de muito tentar, ela desistiu e quase concordou comigo quanto à estupidez de Chaplin. Porém, o tempo foi fazendo com que eu mudasse de opinião. De tudo que foi ensinado ele apenas aprendeu a ficar sobre as patas traseiras para ganhar a comida. Aprendeu a brincar com Mel, nossa gata, e seus três filhos de uma forma tão carinhosa que os felinos adoram e retribuem. Ou seja, aquele "intruso" conseguiu uma convivência invejável com aqueles que são considerados seus inimigos naturais. Acima de tudo Chaplin mostrou uma sensibilidade fora do comum, pois basta ver um de nós com ar de tristeza que já vem fazer carinho, tentando lamber nossos rostos. Se minha mulher finge que está chorando, ele fica desesperado tentando consolá-la. Demonstra ser um cão extremamente feliz que adora crianças e já conquistou o seu lugar aos pés de nossa cama. Enfim, conclui que Chaplin não tem nada de estúpido, pelo contrário, ele é inteligente o suficiente para só se interessar por aquilo que realmente é importante pra ele. Quem sabe, um dia, eu deixo de ser tão estúpido e aprenda alguma coisa com meu amigo Chaplin.
Aventuras de um "urbanóide" no campo
Não adianta! Eu sou um "urbanóide" por essência! Essa conversa de que passar uma temporada em um hotel fazenda revigora e afugenta o estresse, pra mim é papo furado!
O primeiro argumento que as pessoas que querem convencer você a ir usam é o ar puro do campo. Ora, um fumante inveterado como eu, não vai conseguir ar puro nem dentro de um tubo de oxigênio!
Mas tem aqueles que são insistentes e conseguem convencê-lo. Então lá vai você para um hotel fazenda. Lá você convive com a família proprietária. Que lindo! Tem dias que eu não agüento nem a minha e lá sou obrigado a conviver com uma família completamente estranha!
Na primeira noite que você dorme no tal hotel descobre que realmente lá não tem os sons da cidade, mas, em compensação, tem o som de uma verdadeira orquestra de mosquitos que parecem tocar trompetes. De madrugada você descobre que está parecendo um Choquito com catapora de tantos calombos provocados pelas picadas.
Aí eles te acordam às cinco da madrugada para ir ordenhar a vaca. Pra que? O leite não vai estar lá nas tetas da vaca às dez da manhã? Não dá pra fazer isso depois do café matinal? Na verdade, ter que tirar o leite para tomar faz você se sentir como se estivesse num restaurante self-service! E o pior, você chega perto da dona vaca e ela te olha como se estivesse falando:
_ Pô tio, se quer leite, não dá pra ir até a geladeira e pegar numa caixinha longa-vida, ao invés de vir bolinar minhas tetas com essas mãos geladas tão cedo?
Depois, resolvem fazer você caminhar pelo campo. Aquele seu olho de peixe e o calo de estimação não acham uma boa idéia, mas você vai. Começa sentir um cheiro mais ou menos conhecido que lembra a cidade e descobre que é estrume de vaca. Ou seja, é merda, mas é merda com charme!
Chega a hora do almoço e eles servem uma lingüiça com ovos. O cara que te "raptou" e te levou para aquele lugar diz:
_ Na cidade você não come uma lingüiça como esta!
Em seguida:
_ Na cidade você não come ovos como estes!
Só falta ele dizer:
_ Na cidade você não toma uma Coca-Cola como esta!
Aí você chama um dos proprietários do hotel fazenda e pergunta.
_ Para fazer esta lingüiça foram vocês mesmos que abateram o porco?
E ele responde:
_ Quase! O porco era nosso, mas quem matou foi um caminhão da Sadia ali na curva da estrada!
Então levam você à cidadezinha próxima para que você compre artesanatos. Você acaba comprando algum sapato feito de couro cru e mal costurado à mão, pagando mais caro do que alguns Nikes que têm por aí.
E, antes de vir embora, você dá tantas bolas fora que acaba concluindo que não passa de um caipira da cidade no campo e descobre um novo tipo de estresse.
Decididamente, eu sou um "urbanóide" por essência!
Piratas que não são do Caribe
Todo dia nós acompanhamos pela televisão o combate à pirataria de produtos eletrônicos e manufaturados, mas muito pouco, ou nada, se houve falar sobre a biopirataria. Quem conhece um pouco a História do Brasil sabe que a biopirataria contra nosso país teve início quando Américo Vespúcio, em 1501, verificou a abundância de pau-brasil, madeira muito valorizada na Europa, utilizada na preparação de pigmentos para tecidos, pintura em telas e desenhos em papel. E foram séculos de exploração. Mais recentemente, os ingleses, que há muito tempo conhecem o potencial da Amazônia, podem ser considerados os primeiros piratas modernos da biodiversidade da região. O único lugar do mundo onde havia seringueira era na Amazônia. Os índios descobriram suas utilidades confeccionando com o látex bolas rústicas, sapatos e uma seringa que servia para lavagem intestinal (vindo daí o nome seringueira). No final do século XIX e início do Século XX, o inglês Henry Wickman aliciou os índios Tapajós, coletando e selecionando 70.000 sementes e mudas de seringueira. Depois de aclimatá-las no jardim botânico de Kew, em Londres, levou as mudas para as colônias inglesas do Sudeste Asiático, principalmente para a Malásia. Em 1910 a Malásia produziu tanto látex que provocou o declínio do ciclo da borracha na Amazônia, resultando no empobrecimento em massa de sua população. Parece até ironia, mas atualmente, a seringueira esta patenteada nos Estados Unidos, na Inglaterra e no Japão. Depois foi a vez do cacau, também originário da Amazônia, que foi pirateado para a África pelos suíços e de lá levado pelos ingleses ao Sudoeste Asiático. Em 1860, o botânico inglês Richard Spruce pirateou mudas da chincona (árvore da qual se extrai o quinino, único remédio para combater a malária) para a Indonésia que se tornou a maior produtora mundial da substância medicamentosa. Também a castanha do Pará, típica da Amazônia, foi pirateada e em 1944 já frutificava nas colônias inglesas do Sudoeste Asiático, Malásia, Sri Lanka e Trinidad-Tobago. Ainda hoje, os modernos piratas estão ocupando a Amazônia brasileira contrabandeando as suas riquezas naturais, desvendando abertamente a imensurável biodiversidade amazônica, burlando a frágil legislação, ludibriando os nativos e se fartando as custas da miséria do povo brasileiro, sob a suspeita complacência das autoridades governamentais. As indústrias farmacêuticas, de perfumes e cosméticas faturaram bilhões de dólares com a manipulação de materiais levados sorrateiramente da Amazônia. O medicamento Captopril, por exemplo, que é extraído do veneno da cobra brasileira jararaca e utilizado no combate à hipertensão arterial rende anualmente cerca de 10 bilhões de dólares. Por incrível que pareça até mesmo o DNA de índio amazônico já foi registrado nos Estados Unidos (denúncia feita pelo pesquisador indiano Darani Sudaram, da Universidade Federal do Mato Grosso). Segundo o pesquisador é possível comprar em Nova Jersey, por apenas quinhentos dólares, informações sobre o seqüenciamento genético dos índios de Roraima, que são utilizados em pesquisas. É por isso que quando vejo as "batidas" policiais nos calçadões ou nos centro populares de compras, não posso deixar de achar graça.
Assinar:
Postagens (Atom)