Jorge Amado não descobriu o Brasil, pois, diz a lenda, que foi certo almirante português de nome Cabral. Mas Jorge descortinou um Brasil moreno, miscigenado; juntou letras e criou O País do Carnaval (1931). E já que havia criado toda uma nação com uma linguagem própria e seu próprio povo, Jorge sentiu-se na obrigação de continuar administrando esse país através das palavras; palavras que juntadas formavam frases vestidas de brasilidade para desnudar o real e escancarar as portas de uma hipocrisia de coronéis, paradoxo extremo para quem era filho de Coronel João, também Amado e de uma Eulália que tinha tudo de Leal e Amado. E o baiano vindo lá das Terras do Sem Fim (1943), nascido de Ferradas, foi pisando as sementes do Cacau (1933) com muito Suor (1934) para extrair a quintessência da alma de sua gente simples. Mais que o ABC de Castro Alves (1941) e o beabá, Jorge nos ensinou Jubiabá (1935) e como o Cavaleiro da Esperança (1942) viu um Luiz Carlos Prestes a mudar os rumos da História, através do plantio de idéias numa Seara Vermelha (1946). Poeticamente, Jorge trilhou A Estrada do Mar (1938), um caminho feito de palavras, palavrinhas e palavrões, tal e qual fariam Os Velhos Marinheiros ou o Capitão de Longo Curso (1961). Viajou em busca do Mundo da Paz (1950), mas foi nos Subterrâneos da Liberdade (1954) que vislumbrou O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá: Uma história de amor (1976). Uma duradoura história de Amor de Soldado (1947), como num teatro, cultivada pelo zelo de Zélia, que compreendia profundamente o mestre por ser anarquista, graças a Deus! Mas, não vamos exagerar nos elogios! Para sermos realmente honesto, devemos deixar bem claro que de santo não tinha nada e nunca seria um São Jorge de Ilhéus (1944), apesar de ali ter aprendido a infância e as primeiras letras e de saber se guiar, como poucos, pelos caminhos da Bahia de Todos os Santos (1945). Porém, o tempo é o tempo e, mesmo sem Veríssimo, é o vento que leva folhas e páginas em seu bojo. E pra desmentir, de uma vez por todas, que baiano não faz nada de importante numa segunda-feira, Jorge fez... pensando bem; se desfez. Os Pastores da Noite (1964) chegaram cantando e contando coisas que não queríamos acreditar. Talvez Jorge tivesse se enganado ao se vestir. Talvez tivesse confundido Farda, Fardão e Camisola de dormir (1978) e, satiricamente, estivesse aguardando a nossa reação para se dobrar de rir e, quem sabe mais tarde, se divertir às nossas custas quando contasse a Caymmi, enquanto olhassem o mar de um verde vivo! Mas, infelizmente, assim não foi, porque tudo que Jorge fez; fez pra valer. E o grito dos Capitães da Areia (1937) ecoou como um lamento em grandes ondas pelo Mar Morto (1936). Assim como Tereza Batista Cansada de Guerra (1972), o coração do Jorge mais Amado do Brasil também quis descansar e deixou-se emboscar numa Tocaia Grande (1984). Foi como A Morte e a Morte de Quincas Berro D’água (1961). Os olhos de Tieta do Agreste, pastora de cabras (1976) marejaram e, como o insólito e o místico fazem parte do pensar da Bahia, lá foi ela com Dona Flor e Seus dois Maridos (1966) à Tenda dos Milagres (1969) para tentar o impossível. Quem sabe fazer de Jorge um novo Vadinho! Nada a fazer; apenas aceitar! Não há mais o Jorge para sempre Amado, mas há suas pegadas deixadas com letras e grandes palavras na areia de todas as praias do país que ele descortinou, mas não descobriu, porque diz a lenda que foi certo almirante português.
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